sexta-feira, 30 de setembro de 2022

Homeopatia cotidiana n°14

 Já fazia um bom tempo que se apartara de Rubens e de toda a sua irascível genialidade.

Com tanta coisa a resolver e a sobrevivência diária e o cotidiano a se vencer, havia se distanciado da figura  antitética (do grego antithetikós) que ele representava para ela. 

Numa pausa inesperada na rotina maçante, pode descansar seu pensamento e seus ouvidos, quando no rádio ouviu "Baby" na voz de Gal. 

Rubens surgiu diante de seus olhos, aquele Rubens. O maior antagonismo de sua vida. O cara que sabia tanto e ela que pouco sabia. A menina que se apaixonou pelo professor. O ciúme que sabia, não podia sentir mas sentia. Não tinha lógica todos os sentimentos e pensamentos e mesmo todos os planos que fazia sobre seu futuro com Rubens. Mesmo assim os fazia. Numa realidade paralela, num mundo diferente, num futuro onde tudo pode acontecer... 

Uma lágrima escapou de seu olho esquerdo chamando-a de volta à realidade. 

"Esqueci novamente os remédios!" Ansiolíticos, anti-hipertensivo, quetiapinas e aspirinas... Coloca todos de uma vez na boca, engole com um pouco do café que descansava  frio na xícara. 

A gata mia no seu pé pedindo ração, o alecrim quase implora por água, a chaleira apita pronta  para o chá.  A imagem de Rubens vai se apagando de sua mente, mas não por completo. Fica como uma marca d'água...


Baby, baby, eu sei que é assim...


Baby, baby, o inferno é o fogo do sol...

 

"Belo é o que nos arranca do tédio e do cinza contemporâneo e nos reapresenta modos heroicos, sagrados ou ingênuos e de viver ou de pensar. Bela é a metáfora ardida, a palavra concreta, o ritmo forte. Belo é o que deixa entrever, pelo novo da aparência, o originário e o vital da essência. Por isso, o belo é raro."

 Alfredo Bosi